Nasceu romântica
Ela nasceu romântica. Desde pequena sonhava com um príncipe encantado, um conto de fadas, filhos e uma casa bonita com cheiro de pão feito na hora.
Fazia perfumes com o jasmim colhido no prédio vizinho. Uma mistura de álcool e flores guardada com carinho em algum vidro de palmito vazio. Aprendeu a cozinhar com 9 ou 10 anos, fazendo geléia de amoras num banquinho para alcançar o fogão do sítio.
Brincando, abaixava os ombros de sua camisola branca, com estampas miúdas bege e caramelo, e escondida atrás da cortina branca de vual, balançava os cabelos e sonhava com o príncipe encantado ou um forasteiro apaixonado, viagens por terras exóticas em tempos passados como nas histórias que compulsivamente lia.
Foi crescendo, feliz, mas dramática. Se apaixonava perdidamente e sofria… aos 12 anos descobriu que sabia escrever poesias lindas e românticas. Ficou famosa na escola, seus amigos todos sabiam de suas poesias, de suas paixões. Queria ser escritora, perfumista, bailarina ou estilista. Gostava de dançar sempre para alguém, e com a alma no tablado, ela bailava sempre apaixonada. Amava viajar. Desbravar fronteiras e conhecer pessoas. Desenhava suas próprias roupas desde pequena e pedia “Mãe, vamos comprar o tecido?”. A avó achava interessante a menina sempre decidida e costurava com amor suas roupas.
Seu coração jamais esteve vazio. Como escrever, dançar ou viver sem amar? Para ela isto não acontecia.
As poesias cessaram com o tempo, a rotina e a vida corrida. Voltou a dançar, duas horas de alma e corpo unidos por semana.
Hoje, escreve alguns textos, usa perfumes comprados prontos, ainda cria alguns vestidos, compra muitos outros e mesmo sem ter tempo para usá-los, olha no armário e se lembra de como foi romântica, de que para cada vestido há um perfume apropriado, uma música de fundo, uma dança já coreografada, um beijo e um abraço especiais e um final feliz. E finalmente entende o porquê de tantos vestidos de seda e saltos altos. Uma fuga da realidade rumo aos sonhos românticos de um passado tão distante que nem parece ter sido nesta vida.
A vida dela é diferente do imaginado, porém ainda assim é bonita. Mas às vezes, tarde da noite, sentada a frente de seu computador, ela sente muita saudades de seus sonhos jamais realizados, sente saudades de poder ter sido bailarina, escritora, perfumista ou estilista, saudades dos sonhos românticos embalados por músicas de filmes de amor. E se pergunta com lágrimas nos olhos “Por que meus sonhos foram alterados pela vida”? E vai dormir, porque amanhã a realidade volta, a luta continua e os sonhos ficam guardados no coração esperando uma próxima poesia, conto ou dança para se tornarem ao menos um pouco reais.